A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho não conheceu de recurso da Enecolpa Engenharia Eletrificação e Construção Ltda. contra condenação ao pagamento de indenização por dano material e moral à viúva de um eletricista assassinado por um morador da cidade de Pacajá (PA) inconformado com o desligamento da ligação clandestina de energia elétrica (gato) em sua casa. O relator do recurso de revista, ministro Walmir Oliveira da Costa, observou que, embora o crime tenha ocorrido fora do expediente, o trabalhador já sofrera diversas ameaças em razão de seu trabalho, e caberia à empresa zelar pela sua segurança.
O eletricista, de 26 anos, era empregado da Enecolpa, prestadora de serviços das Centrais Elétricas do Pará (Celpa). O homicídio aconteceu em agosto de 2007. No dia 30 daquele mês, a equipe de trabalho do eletricista retirou o “gato” constatado numa residência em Pacajá. À noite, quando saía de uma lanchonete na companhia do gerente da Celpa, dentro do carro da empresa, foi abordado pelo dono da casa, que perguntou se ele sabia quem cortou a ligação clandestina de sua casa. O eletricista respondeu que deveria ter sido a sua equipe, que trabalhara naquele dia em sua rua. O morador então disse “Então foi você”, sacou um revólver e disparou dois tiros no trabalhador, que morreu dois dias depois.
Sua companheira, mãe de seus três filhos pequenos, ajuizou reclamação trabalhista na 1ª Vara do Trabalho de Tucuruí (PA) com o pedido de indenização por danos materiais e morais. Alegou que, depois da morte do marido, passou a depender de favores de terceiros para a sobrevivência própria e dos filhos, e foi acometida de “verdadeiro pânico”. O valor pedido a título de danos materiais foi de R$ 370 mil, correspondente ao salário do eletricista até que completasse 65 anos. Pelo dano moral, pediu a quantia equivalente a 200 vezes o salário mínimo vigente, totalizando R$ 93 mil.
A Enecolpa, na contestação, sustentou a ausência de relação entre o crime e a função desempenhada pelo eletricista, afirmando que, no momento em que foi alvejado, ele não estava em horário de trabalho. Alegou ainda que a retirada do “gato” foi totalmente legal, sem configurar arbitrariedade por parte da empresa, e que não houve, de sua parte, qualquer ato contrário às normas de segurança do trabalho ou negligência. Para a empresa, o homicídio foi “uma fatalidade” a que qualquer pessoa está sujeita, não lhe cabendo, portanto, a obrigação de indenizar.
A juíza de primeiro grau acolheu a argumentação da Enecolpa e julgou o pedido da viúva totalmente improcedente. O Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (PA/AP), porém, ao julgar recurso ordinário, reformou a sentença e concedeu a indenização, condenando a Celpa subsidiariamente, na condição de tomadora do serviço.
O acórdão do Regional observa que, de acordo com os depoimentos das testemunhas, o eletricista e outros trabalhadores na mesma função sofriam várias ameaças pelo corte dos “gatos” numa região considerada perigosa. Para o TRT, a morte decorreu do serviço prestado pelas empresas, independentemente de ter ocorrido fora do expediente ou do local de trabalho – mas dentro de um veículo da empresa.
Assinala, também, que não havia provas de que as empresas tomassem efetivas medidas de segurança e proteção para seus trabalhadores nessa situação. “Embora a atividade de eletricista não seja exposta a riscos de violência, no caso os trabalhadores eram expostos a risco iminente, pois eram habitualmente ameaçados pelos consumidores que se sentiam lesados, e as empresas tinham ciência desse fato”, registra o acórdão. “Logo, cabia a elas garantir proteção à sua integridade física ou tentar minimizar os riscos de violência, o que não foi provado nos autos”, concluiu o Regional, fixando a indenização em R$ 265 mil por danos materiais e R$ 93 mil por danos morais.
A Enecolpa recorreu então ao TST questionando o reconhecimento de sua responsabilidade pela morte do empregado e reiterando a argumentação apresentada na defesa. Para a empresa, a decisão regional violaria o artigo 144 da Constituição da República, que atribui ao Estado o dever de garantir a segurança pública.
O ministro Walmir Oliveira da Costa, porém, considerou que a indicação de ofensa a esse dispositivo constitucional não era um argumento adequado para questionar a decisão do TRT, cujo fundamento foi o da omissão da empresa em adotar medidas efetivas de proteção e segurança de seu empregado diante das ameaças sofridas. Ele ressaltou que a condenação não significa atribuir à empresa a responsabilidade pela segurança pública – “que é incontroversamente dever do Estado” -, mas a incumbência de zelar pela segurança do trabalhador está prevista nos artigos 7º, inciso XXII, da Constituição e 157, inciso I, da CLT. (Fonte: Carmem Feijó/TST)
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